São duas horas da manhã, e você deve estar se perguntando o porquê de Lucy e eu estarmos num beco de Londres uma hora dessas, enquanto poderíamos estar dormindo. Ah, é simples: porque estamos prestes a matar um lobisomem faminto. Isso mesmo. Um lobisomem. Meu segundo dia em Londres, e estou perto de ser morta.



Não, não estou, o lobisomem é que está, há-há.


Lucy encostou-se no conversível e olhou-me.


- É melhor você se apressar, querida. Ele já está vindo. – apontou para o Lobisomem que vinha correndo em nossa direção.


- Será que eu nunca terei um descanso? Tipo, depois de um dia longo e chato, pelo menos o que eu deveria fazer era tirar um cochilo ou tomar um sucozinho de maracujá para acalmar meus nervos, porque, realmente, estou precisando disso, amiga. – levantei uma hipótese para Lucy sem tirar os olhos do lobisomem. – Mas voltando ao foco, que é o nosso amiguinho ali – apontei - Como você quer que eu o mate sem ter uma arma adequada? – levantei meus punhos e endireitei-me.


Posição de ataque é fundamental. Bom, para mim é.


- Hm, bem pensado. Você pode tomar conta do trabalho com o punhal, o resto você deixa por minha conta. – olhou para suas unhas.


- Ah, dane-se. – revirei meus olhos e corri para o lobisomem.


Dei um salto mortal duplo e depois acertei o alto de sua cabeça com o calcanhar. O lobisomem guinchou de dor e caiu de queixo no chão, fazendo um barulhinho irritante. Aproximei-me dele, agachei-me e puxei o punhal que estava preso ao meu tornozelo. E o que houve a seguir não foi legal, porque o peludo puxou meu pé e eu caí de costas no chão molhado. Levantou-me pela perna, fiquei de cabeça para baixo e a única arma que eu tinha no momento, havia caído na poça de água. Droga! Tentei pegá-la, mas o lobisomem me jogou contra o poste e eu gritei de dor por causa do impacto.


- LUCY, AJUDE-ME! – estendi uma mão na sua direção.


Nunca pensei que eu fosse pedir ajuda a senhora-do-conversível.


- Francamente, Frankie. Você é bem mais forte do que isso e já enfrentou caras mais fortes, então não precisa da minha ajuda. – respondeu calmamente.


Como ela poderia estar tão calma, vendo-me levar uma surra? Estava sendo egoísta. Foi ela mesma que disse que ia me ajudar quando saímos de casa. Estou pensando realmente se aquilo foi da boca pra fora.


Fiquei de joelhos com as mãos no chão. Fui levantando aos poucos até estar totalmente de pé. Senti uma dor aguda na nuca e toquei-a. Estava sangrando. Minha respiração começou a alterar-se quando olhei minha mão ensangüentada, mas não de medo, e sim de raiva. Subitamente, soquei o posto que estava ao meu lado e ele caiu. Pois é, caiu mesmo. Olhei para Lucy. Ela estava tão surpresa quanto eu.


- MUITO BOM, GAROTA! MUITO BOM MESMO! – levantou um braço e começou a acenar freneticamente.


Sorri com a força que estava surgindo no meu corpo. Comecei a correr novamente, dessa vez mais rápido do que antes, golpeei o lobisomem na barriga e ele voou, mas um muro de pedras parou sua queda. Andei normalmente até ele, fiquei à sua frente e agachei-me.


Uh, aquelas criaturas eram feias.


- Seja homem e olhe para a garota que vai te matar. – puxei sua cabeça para trás. – Vamos, olhe-me! – exigi.


E olhou mesmo, mas com raiva. Então lembrei que estava desarmada e olhei para o lado, a fim de achar meu punhal. Excelente, irei morrer. O peludinho percebeu meu nervosismo e empurrou-me mais uma vez, no entanto, sem força. Caí ao lado da poça de água onde meu punhal havia caído. Recuperei-o e apontei-o para a direção do lobisomem que corria em alta velocidade. Não tive tempo de levantar-me e ele caiu em cima de mim. Só lembrei-me de erguer o punhal e acertar seu abdômen. O “cachorrinho” gritou de dor por uns trinta segundos sem parar e, finalmente, desmaiou. Oh, que peninha. Olhei-o e empurrei-o para o lado. Levantei-me, retirei meu punhal com brutalidade de onde estava e dei às costas para o corpo estendido no chão.


- E aí, Lucy? Gostou da minha apresentação? – levantei meu polegar.


Lucy apontou para o que estava atrás de mim sem falar nada e virei para olhar o que era. A próxima coisa que senti foi sangue escorrendo do meu peito. O lobisomem havia me arranhado profundamente e fez o favor de rasgar minha blusa de alcinha preferida, deixando a metade do meu sutiã à mostra. Caí no chão de bunda, pressionando meu corte com a mão. Poxa, eu estava desprevenida. Ele pulou na minha direção, mas algo o acertou. Olhei para o lado assustada e vi Lucy com a arma apontada na direção do peludo. Voltei o olhar para ele e senti dó, porque estava se contorcendo no chão de tanta agonia, ao mesmo tempo em que virava humano e morria.


Porém, quando se transformou em homem novamente, ele não era tão feio. Foi um desperdício para a sociedade perder um cara com charme, mesmo que não fosse muito bonito.


- Ajude-me... – foi a última coisa que ele disse.


Acho que eu nunca iria me acostumar com o fato de matar lobisomens, porque eles eram humanos, e com vampiros era diferente, pois eram semimortos e “fominhas” que não se controlavam por sua sede de sangue, por isso, eu não tinha piedade com aqueles morcegos. Hm, deixe-me explicar uma coisa: quando eu matava os lobisomens, no final, era do mesmo jeito dos vampiros. Eles viravam cinzas. Infelizmente, não sei o porquê, mas era sempre assim. E foi o que aconteceu com o peludão que matei: virou cinzas e o vento espalhou-as pela rua.


Lucy aproximou-se de mim e olhou-me.


- Quem mandou você cantar vitória antes do tempo?! – perguntou, ao meu lado, levantando-me pelo braço. – Garota, você tem muito que aprender, mas você tem uma força incrível. Até mais do que eu, sabia? O máximo que eu consigo fazer são só uns socozinhos e puxões que quebram coisas frágeis. – pôs um braço em volta da minha cintura e continuou. – Eu realmente não conseguiria derrubar um poste só com um soco. Nem sua mãe, nem meus ancestrais e nem Sté... – pausou e olhou para o alto de um prédio. – Não acredito nisso. É melhor você entrar no carro, querida. Não está em condições de lutar.


Segui o olhar de Lucy e ouvimos um uivado alto. Lobisomem. Mais um? Nunca matei dois de uma vez. Empurrei Lucy para o lado e fiquei em posição de ataque, com uma mão sobre o arranhão que ainda sangrava. Olhei o lobisomem e ele segurou meu olhar. Pôs-se de pé e inclinou-se para frente como se fosse pular. Oh, não. Aquele era enorme. Maior do que o outro. MUITO maior. Peludo dois pulou na minha direção, e como eu não tinha nada a fazer, pus meus braços à frente do meu rosto – como se aquele gesto fosse me proteger de algo. Segundos depois, percebi que nada havia me atingido e tirei meus braços da frente. Não havia mais nada ali, a não ser as cinzas do peludo dois misturando-se ao vento. Olhei para Lucy com um ponto de interrogação no rosto e percebi que não fora ela que matara o lobisomem silenciosamente, e sim a garota que estava em cima do prédio. Lucy não desgrudava o olhar do dela.


A garota estava de pé, segurando uma arma dourada voltada para baixo em cada mão, olhando-nos com repugnância, e o vento deixava à mostra seu cabelo comprido e loiro.


Detalhe: ela era muito corajosa para estar usando um short curto e uma blusinha acima do umbigo numa madrugada fria. Também usava um tênis de cano longo e um colete minúsculo por cima da blusa MINÚSCULA. Enquanto eu usava um jeans apertado, uma blusa de alcinha – que fora rasgada tragicamente – e meu all star velhinho favorito. Espera aí, ela acha que veio para um desfile de moda? Porque a garota parecia mais uma modelo do que uma assassina.


A loira soltou um risinho sarcástico e olhou para Lucy.


- Oh, Lucy Hime, não acredito que esteja treinando crianças. – olhou-me e cruzou os braços. – E ainda por cima, uma hora dessas? Tsc, tsc. – balançou a cabeça de um lado para o outro, reprovando.


Criança?! Quem ela pensa que estava chamando de criança?! Quando eu chutasse o seu traseiro, ela iria ver quem era a Frankie de verdade. Nem esperei Lucy responder, intrometi-me no meio.


- Ah, é? E por que você não desce aqui para termos uma conversinha? – dei um passo à frente. – Desça aqui, minha filha. Aí você vai ver quem é a criança.


- Como quiser. – guardou as armas nos bolsos traseiros do short, inclinou-se, pulou do prédio com leveza, chegando ao chão sem fazer barulho e sem cair.


Jogou o longo cabelo para trás e caminhou na nossa direção, ficando diante de mim e olhou para Lucy.


- Hime, o que pretende fazer treinando essa pirralha? – piscou umas duas vezes seguidas, deixando claro que tinha olhos verdes e brilhantes. – Não estamos no jardim de infância para você inventar brincadeirinhas sem graça.


Eu ia protestar, mas Lucy me interrompeu.


- Stéph... Quanto tempo, querida. – estendeu os braços na direção da loira como se fosse abraçá-la, mas não houve ação da parte da tal de Stéph, então, continuou. – Já faz sete anos desde que você foi embora...


- Não quero saber disso, Hime. Quero saber o que está pretendendo fazer com essa baixinha. – interrompeu-a.


- Não preciso ensiná-la muitas coisas, porque ela teve uma mãe extraordinária que a treinou quando ainda era criança. – explicou. – Mas a Frankie precisa de muito treinamento, não é? – olhou-me e sorriu.


Nem respondi sua pergunta e muito menos retribui seu sorriso idiota. Fui logo ao ponto e avancei mais um passo, ficando apenas alguns centímetros de distância da loira.


- Quem é você, loira de farmácia? – perguntei. – Você não tinha nada a ver com a minha luta. Eu ia acabar com o lobisomem com apenas um dedo. – levantei meu dedo indicador. – E você fez o favor de me interromper.


- Ah, sério? – Stéph fez uma ceninha como se estivesse surpresa. – Porque eu não previ isso quando você pôs os braços na frente do seu rosto para se proteger. – inclinou-se para frente. – Não é um rostinho bonitinho que vai salvar as pessoas, garota. Entenda isso. – endireitou-se e pôs uma mecha de seu cabelo atrás da orelha. – Por sorte você não morreu. Deveria estar me agradecendo.


- Agradecer? Faz-me rir, cara. Não posso morrer. – sorri sarcasticamente. – Ah, e estou prevendo um pé na bunda agora. – avancei, e numa tentava absurda, tentei segurar seu pescoço, mas ela se esquivou. Assim, do nada. Puf!


- Isso é jeito de tratar as pessoas que você acaba de conhecer? – falou por trás de mim.


Tentei olhá-la, mas Stéph chutou minhas costas e eu caí. E para falar a verdade, doeu pra caramba. Então, tentei me levantar, mas ela pôs o joelho em cima da minha coluna, pressionando-a com força. Puxou meu cabelo e falou em meu ouvido:


- Você não é uma pessoa digna para ser chamada de caçadora. Você é apenas uma garota fútil e arrogante. Ah, é mesmo. Havia me esquecido. Estou no mesmo colégio que você, e se entrar no meu caminho, pode acreditar, vai se arrepender de ter entrado nele. – Stéph puxou meu cabelo com mais força, empurrou minha cabeça contra o chão e levantou-se. – Não acredito que esteja treinando essa baixinha! – dirigiu-se à Lucy. – Assim... Não acredito mesmo! - havia indignação na sua voz.


- Stéph, você tem que entender nossa situação. Está ocorrendo algumas mortes nessa cidade, e temos que impedir que essas mortes continuem. – vi quando Lucy se aproximou de Stéph e segurou seus ombros. – Por favor, junte-se a nós. – eu poderia jurar que havia lágrimas nos olhos cinzentos de Lucy. – Não vá embora novamente, querida. – abraçou-a, mas a loira nem se mexeu, apenas revirou os olhos e libertou-se dos braços de Lucy.


- Ah, Hime, tenha dó. Não venha com seus abraços melancólicos. – ajeitou as roupas. – Nem adianta me fazer uma proposta dessas, porque você sabe muito bem que eu trabalho sozinha e não preciso da ajuda de ninguém. – olhou-me. – Quanto mais dessa anã de circo.


Ok, essa última frase não foi legal. Anã de circo? Eu não era tão baixinha assim. Fala sério!


Levantei-me com raiva.


- Olha aqui, garota. Não precisamos da sua ajuda, certo? Sou mais habilidosa que você, e pode acreditar, não haverá mais mortes. – limpei o sangue que estava escorrendo da minha testa, porque a machuquei quando minha cabeça foi arremessada contra o chão.


- Mas é claro que não. E sabe por quê? Porque eu matarei essas criaturas antes de você. – sorriu e virou as costas. – A propósito, é melhor você controlar essa raivinha amanhã, porque iremos nos ver. – pulou com velocidade, subiu o prédio em que a vi pela primeira vez e desapareceu na escuridão.


Olhei Lucy e ela estava olhando para mim. Havia preocupação em seus olhos orientais.


- Você está bem, Frank? – olhou para meus ferimentos.


- Oh, mas é claro, H-I-M-E. – enfatizei a última palavra. – Poupe-me dessas suas preocupações absurdas. Se realmente se importasse comigo, naquela hora em que pedi ajuda, não teria recusado. Eu quase morri...


- Ah, certo. Não te ajudei? Hm, vejamos. Quem matou o lobisomem para que ele não acabasse com a sua vida? – levantou uma sobrancelha. – Pare de não reconhecer o que faço por você. – virou-se para a direção do carro e andou até ele.


Ignorei o que ela falou e prossegui.


- E por que não me contou sobre a Stéph? – limpei o sangue da minha testa mais uma vez. – E que história é essa de “Hime”? – fiz aspas no ar.


- Por favor, falaremos disso no carro. – abriu a porta do motorista e entrou.


Deixei meus ombros caírem de tão cansados que estavam e arrastei-me até o carro preguiçosamente. Abri a porta do carona e entrei. Fechei-a com muita força e olhei para Lucy.


- Pode me explicar agora? – apoiei minhas mãos nos joelhos.


- Tudo bem. – suspirou. – Stéph foi minha, digamos, aluna. Encontrei-a na frente da minha porta há dezessete anos. Treinei-a até os dez anos, porque ela decidiu que sozinha seria mais “vitoriosa”. – sorriu tristemente, apertando o volante. – Eu não a impedi, porque não era minha filha e ela já tinha noção de como era o mundo. Desde aquele dia, nunca mais a vi, até nos reencontramos hoje. Não sei explicar de onde aquela garota tirava tanta força. Ela é mais forte do que eu, porém, não supera você. – ela ligou o motor do carro e arrancamos. – Stéph me chama de Hime, porque significa “princesa”. E eu costumava contar histórias para ela envolvendo princesas vitoriosas. E meu sobrenome é Hime, então, traduzido fica: Princesa Lucy. Meus pais acreditavam que eu protegeria meu clã, mas não ocorreu o que eles esperavam. Fui covarde e fugi. – ela parou o carro e nem percebi que já estávamos à frente da mansão.


Eu realmente nunca iria me acostumar com a velocidade inexplicável do carro de Lucy. Chegamos à fração de segundos.


- Ah, e a propósito. Stéph usou uma arma silenciosa e de rápido efeito. Foi por isso que você não ouviu nada. – explicou-me.


- Não quero que você cuide de mim para substituir o vazio que a Stéph lhe deixou. – falei baixinho, ignorando seu último comentário. – Eu posso me virar sozinha. – abri a porta e saí do carro.


Quando eu menos esperava, Lucy estava à minha frente. Assustei-me e levei minha mão esquerda até o coração. Ela realmente tinha que parar com isso.


- Frankie, você não está substituindo o vazio que Stéph me deixou. Eu vejo algo a mais em você do que essa arrogância. Você se importa com os outros. – pôs uma mão sobre meu ombro e sorriu. – E pode fazer o que quiser pelas pessoas que não morrerá. – apontou para a ferida do meu peito. – A menos que cortem sua cabeça.


Olhei para meu peito e não havia mais nada. A ferida havia sumido e só minha roupa ficara ensangüentada e rasgada. Toquei o lugar onde o lobisomem tinha me ferido e levei minha mão a testa. Toquei-a e não havia mais sangue. O mesmo vale para a minha nuca machucada. Sem arranhões. Olhei para Lucy e sorri pausadamente, ficando impressionada. Eu nunca havia me recuperado tão rápido daquele jeito.


- Lucy, o que significa isso? – segurei os seus braços entre as mãos, com força, mas eu estava sorrindo.


- Hm, acho que você está “crescendo”. – respondeu-me.


Soltei seus braços e passei meus dedos entre os fios do meu cabelo. Ri alto, com uma intensa alegria, girei e em seguida, abracei Lucy.


- ISSO É DEMAIS! – gritei, olhei Lucy e a vi sorrindo.


Parei de abraçá-la e corri em direção à varanda, gritando mais uma vez:


- ISSO É DEMAIS! – abri a porta e entrei na mansão.


A minha casa. É, isso soava bem.


***


Ouvi uma voz masculina perto da minha orelha. Eu provavelmente estava sonhando. Nenhum cara viria me visitar. Sorri de olhos fechados e apertei o travesseiro contra minha bochecha.


- Frankie? – disse a voz nos meus sonhos.


Mas que voz legal o cara tinha. Era brasileiro com um pouco de sotaque inglês. Apertei mais ainda o travesseiro contra minha bochecha e cocei meu olho. Abri-o um pouco e vi um vultozinho moreno sentado à minha frente, olhando-me com curiosidade.


Que lindo. Eu já estava imaginando coisas. O vulto parecia até o Sam. Sorri e pus a mão em cima da minha barriga. Espera. O Sam? Abri meus olhos com rapidez e fitei o teto.


Ah, que bom, não era o Sam.


Mas meus pensamentos caíram quando senti uma mão morena apertar minha bochecha com delicadeza.


Sentei rápido, olhei Sam e arregalei meus olhos.


- Uau, eu realmente deveria ter vindo aqui antes. – sorriu maliciosamente e filmou-me dos pés a cabeça.


- O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO AQUI?! – perguntei o mais alto que pude, ao mesmo tempo em que puxava as cobertas para me cobrir.


- Ué, não vai me dar um “Boa tarde, Sam. Que bom que veio me visitar”? – cruzou os braços e levantou uma sobrancelha.


- BOA TARDE?! QUE HORAS SÃO, SAM?! – puxei o pulso dele, onde havia um relógio. – OH, MEU DEUS! TRÊS E MEIA DA TARDE?! POR QUE LUCY NÃO ME ACORDOU?! EU NÃO ACREDITO QUE PERDI MEU SEGUNDO DIA DE AULA! – eu estava louca.


- Segundo dia de aula? Você quer dizer o quarto dia de aula, não? – coçou a cabeça. – Por quanto tempo você dormiu, Frankie?


- QUARTO DIA DE AULA?! – levei minhas mãos às bochechas. – Não acredito que dormi durante três dias seguidos! – levantei-me, esquecendo as cobertas em cima da cama.


Percebi que Sam estava me olhando um tanto interessado. Então, olhei-me.


Oh, não. Quem havia trocado minhas roupas? Por que eu estava usando meu short MINÚSCULO de dormir e minha blusa MINÚSCULA que ficava muito acima do meu umbigo?


Imaginei Lucy me trocando no dia em que eu apaguei totalmente. Ela que trocou minhas roupas.


Há-há, aguarde-me, senhorita Lucy.


Olhei Sam novamente, peguei as cobertas de cima da cama e enrolei-me. Puxei-o pela mão e arrastei-o até a porta.


- Escute-me, garoto. Não sei o que você está fazendo aqui no meu quarto, nem muito menos sei como achou a minha casa, mas só sei que você vai esperar lá na sala, entendeu? – fuzilei-o com os olhos, abri a porta do meu quarto e empurrei-o para fora.


- Perfeitamente, Fran. – sorriu e deu uma piscadinha.


- “Fran” uma ova. – bati a porta na sua cara, sem esperar por uma resposta.


Não acredito que Lucy deixou Sam vir me visitar. Ela teria que me ouvir muito quando eu a visse.


Joguei os lençóis na cama e caminhei para o banheiro. Olhei-me no espelho e eu estava horrível. Fiz uma careta de nojo. Liguei a torneira e joguei água no meu rosto, escovei os dentes e fui para debaixo do chuveiro. Tomei um banho SUPER demorado, porque eu havia dormido durante três dias seguidos e, bem, era o mínimo que eu podia fazer. Desliguei o chuveiro e peguei a toalha. Dirigi-me a meu quarto. Abri a gaveta da penteadeira, peguei um jeans preto e uma blusinha branca. Vesti-me, enxuguei meu cabelo com a toalha e calcei meu par de tênis azul.


Saí do quarto e nem me preocupei de arrumar a cama. Desci as escadas com pressa e encontrei Sam sentadinho no sofá, olhando as coisas em volta e, quando me viu, assobiou.


- O que é que você está fazendo aqui, Sammuel? – fiquei à sua frente e cruzei os braços.


- Eu estava preocupado, já que você faltou três dias seguidos. Aí, resolvi vir visitá-la. – sorriu.


- Mentiroso... Você mal me conhece. Só me viu um dia na vida e já fica com saudades? Faça o favor de contar outra, Sam. – joguei-me ao seu lado no sofá. – Como achou minha casa? – olhei minhas unhas despreocupadamente.


- Bem, eu perguntei a Lucy. Eu a vi no colégio. Acho que ela estava falando com o senhor Antônio sobre suas faltas, sabe. Então falei com ela e perguntei onde você morava, porque eu queria trazer os assuntos que você perdeu esses dias, e Lucy me disse que eu poderia vir aqui. – olhou-me.


- Primeiro: como você soube que eu moro com a Lucy, e segundo: onde estão esses assuntos? – perguntei sem interesse algum.


- Bom, vi você descendo do conversível preto no dia em que te conheci, e vi Lucy à frente do volante. E, bem, não há dever de casa, porque os professores não passaram nenhum. – riu pausadamente. – A verdade é que Joe queria te ver e está lá fora neste momento.


- Não há dever de casa?! E quem, por acaso, é Joe?! – inclinei-me para ele. – Você está zoando com a minha cara, Sam?!


- Claro que não estou! Joe é Joseph. O cara queria te ver. – explicou-se rapidamente. – O cara está gamado em você, poxa!


- Faz-me rir, gatinho. – ajeitei meu cabelo e cruzei as pernas. – Joseph mal me conhece para estar “gamado” em mim. – fiz aspas no ar. – Quem, em sã consciência, iria gostar da minha pessoa? – soltei um risinho.


- Ele, ué. – deu de ombros. – Você atraiu o cara, Frank. Como um imã, entendeu? – gesticulou com as mãos.


- Não. – fiz um olhar de quem estava totalmente cansada daquela conversa. – E também não quero entender, Sam. – descruzei minhas pernas e apoiei-as sobre uma mesinha que havia à frente do sofá onde estávamos sentados. – Mas e aí? Vai deixar o cara morrer de frio lá fora? – roí uma unha e olhei para o nada.


- Você quer que eu o chame para se juntar a nós? – olhou-me com cautela.


- Não. Imagina, querido. – olhei-o e pus MUITA ironia na minha resposta. - Deixe-o congelar debaixo das árvores, até que o sol apareça e o derreta. – sorri com falsidade e fiquei séria. – Vai chamar logo esse garoto, Sam! – suspirei, saindo “fumaça” pelas minhas narinas.


- Frank, como você é má. – levantou-se.


- Mais do que você imagina, fofo. – apertei meus olhos e dei mais um risinho falso.


Sam não respondeu nada, apenas assentiu com a cabeça, virou-se, caminhou até a porta, abriu-a, saiu e deixou-a aberta.


O Sam? Hm, deixe-me pensar... Ah, o Sam é um folgado, que chega à casa dos outros e invade seus quartos, depois disso, sai e deixa a porta aberta como se fosse a sua própria casa...


Mas antes que eu pudesse concluir meu julgamento sobre Sam, ele já estava de volta, exibindo um sorriso de orelha a orelha, ao mesmo tempo em que escancarava a porta e deixava o vento gelado da tarde entrar. Nenhum vestígio de Joseph.


Suspirei de alívio, fechei meus olhos e sorri por dentro, entretanto, quando os abri novamente, Joseph estava de costas, acabando de fechar a porta. Virou-se, olhou de Sam para mim e lançou-me um sorriso encantador.


Ok, não sei o que houve, mas eu levantei subitamente e corei. Não sei se foi a roupa do cara, ou seu sorriso, mas fiquei SUPER vermelha. Qualquer uma ficaria se o visse vestido daquela forma. Joseph usava uma malha azul escuro que ia até os pulsos, super apertada, deixando à mostra - sob a malha - seus bíceps, seu peito largo, seu abdômen, enfim, sua musculatura elegante, que deixou meus pensamentos desorientados; um jeans não muito apertado e um par de all star. Estava mais arrumado do que a primeira vez que o vi, menos o seu cabelo bagunçado que o deixava com charme.


Joseph desceu os dois degraus que havia depois da porta, começou a caminhar até onde eu estava, parou à minha frente e passou os dedos de sua mão direita entre os fios de seu cabelo.


- Linda... – sorriu.


- O quê? – nem prestei atenção no que ele falou.


- Você está linda... – aproximou-se de mim mais um pouco.


Meu coração quase que saía pela boca. Em seguida, pisei no meu cadarço e tropecei, caindo para frente, mas Joseph me segurou pela cintura e sussurrou algo em inglês - que eu não consegui decifrar.


- Ah, corta essa. – ri histericamente e, mais do que depressa, afastei-me dele e caminhei – quase correndo – na direção de Sam.


Puxei-o pela manga de sua camisa e joguei-o no sofá onde estávamos sentados há pouco tempo. Sentei-me ao seu lado, olhei para o nada e fiquei cantarolando baixinho de tão nervosa que estava. Um segundo depois, Joseph sentou do meu lado e cruzou os braços diante do peito.


Eu estava entre dois garotos fortões e gatos e não tinha controle da situação, mas por sorte, Sam começou a conversar.


- Frank, quando fui a seu quarto, percebi que nas paredes do corredor há muitas armas. Hm, estão com medo de ser assaltadas ou o quê?


Oh, não. Eu realmente tinha que inventar mais uma mentira. Olhei para o teto em busca de resposta.


- Bem, é que... Os pais de Lucy eram... Eram... Caçadores de animais, sabe. Por isso que há tantas armas. – cocei minha testa com nervosismo.


- Mas não é proibido? – Sam levantou uma sobrancelha.


- Eu disse “eram”, dã. E naquela época não era proibido. Pelo menos, eu acho que não. – expliquei.


Joseph cutucou meu ombro de leve e perguntou algo desnecessário - acho que ele leu meus pensamentos, porque eu realmente não queria continuar aquela conversa sobre armas e blábláblá.


- E então? Por que resolveu morar neste país? Os estudos, é isso? – lambeu os lábios suavemente.


- Sim... – respondi quase sufocando com a lambida de seus lábios.


- Legal. Moro aqui desde meus onze anos de idade. Você irá se acostumar, ainda mais se estiver com alguma companhia, talvez. – sorriu, mostrando todos os dentes.


Dentes branquinhos da Silva, beleza?


- Com toda a certeza. – sorri debilmente.


- Vai ao colégio amanhã, não é?


- Claro... – minha voz saiu feito um piado.


Depois disso, ninguém mais abriu a boca. Passamos uns cinco minutos calados – só olhando para o nada – sem nos mover. Minha coluna já estava doendo.


Por favor, por que Sam não estava falando nenhuma idiotice?


Salve-me quem puder!


Por isso, olhei para frente e levantei-me.


- Com licença, rapazes. Mas acho que já está ficando tarde, e é melhor você dois irem para as suas casinhas. – indiquei a porta com o dedo sem olhá-la.


O primeiro que levantou foi Joseph e depois – com muita preguiça – Sam.


- Bom... Até amanhã? – perguntou Joseph.


- É. – pus minhas mãos na cintura.


Joseph inclinou-se para mim, afastou meu cabelo com a mão e sussurrou em meu ouvido:


- Espero você amanhã. – falou. - Estarei lhe esperando à frente do colégio. – seus lábios roçaram na minha orelha de leve, fazendo-me arrepios.


Então, beijou minha bochecha rápido e caminhou até a porta. Abriu-a e desapareceu por ela.


Olhei para a porta e voltei meu olhar para Sam.


- Sabia que ele se arrumou todo só para ver você? – pôs uma mão em um bolso de sua calça e caminhou em direção a porta, como Joseph fez. – Tchau, Fran. – mandou beijinho, acenou e desapareceu pela porta, fechando-a.


Fiquei parada no meu lugar, feito estátua, olhando para a porta. Depois de um minuto foi que consegui organizar meus pensamentos e sair daquele estado de transe. Sentei no sofá e deitei-me.


Quatro dias em Londres, e um cara já estava arrastando uma asinha para mim? Que loucura. E ainda por cima o cara era muito lindo. Esqueci até que “odiava” Joseph.


Ri baixinho e fechei meus olhos.

2 Response to " "

gravatar
Stéphanie Says:

Caramba. Muito muito bom! *-*

gravatar
Unknown Says:

ééé xiimmm, um simuladoor de situações viuu!!
meus parabens! ;D

Postar um comentário